HomeLições ExplosivasLições Explosivas | Caso West Pharmaceuticals
Lições Explosivas
5
minutos para leitura

Lições Explosivas | Caso West Pharmaceuticals

A fábrica e o que ela produzia

Localizada em Kinston, na Carolina do Norte (EUA), a unidade da West Pharmaceutical Services operava desde 1975 em um parque industrial próximo a um aeroporto. Com cerca de 14.000 m², a fábrica funcionava em regime contínuo, 24 horas por dia, cinco a seis dias por semana, e empregava 264 funcionários diretos e 35 contratados. A West é uma das maiores fabricantes do mundo de tampas e componentes para vedação de frascos e seringas pré-cheias. Com sede em Lionville, Pensilvânia, a empresa contava, em 2003, com cerca de 4.000 funcionários em oito fábricas na América do Norte e dez na Europa e Ásia. Fundada em 1923, a companhia registrou vendas superiores a 490 milhões de dólares naquele ano.

Na unidade de Kinston não se fabricavam medicamentos, mas sim componentes de borracha para dispositivos farmacêuticos, como êmbolos de seringas, septos e tampas para frascos. Para isso, a planta realizava três etapas principais: a composição da borracha, na qual os insumos eram misturados em grandes misturadores; a laminação, onde essa mistura era transformada em tiras; e, por fim, o acabamento e a moldagem, quando as tiras eram prensadas e transformadas em peças finais.

Os materiais e processos

Na etapa de resfriamento e corte das tiras de borracha (conhecida como batch-off), utilizava-se um pó de polietileno misturado à água como agente antiaderente para evitar que as tiras grudassem umas nas outras. Esse pó, porém, escondia um risco grave: suas partículas extremamente finas permaneciam suspensas no ar de forma praticamente invisível e, com o tempo, se depositavam em locais pouco acessíveis, como a região acima do forro suspenso na área de produção.

A West Pharmaceutical tinha a limpeza como prioridade. A fábrica contava com sistemas de ventilação, desumidificação e filtragem e mantinha equipes de limpeza em tempo integral, 24 horas por dia, garantindo um ambiente que, à primeira vista, parecia impecável e organizado, algo indispensável para um local que produzia peças destinadas ao setor médico. No entanto, toda essa aparência de ordem escondia um perigo silencioso: as áreas mais altas e isoladas, acima das máquinas de batch-off e do forro suspenso, ficavam fora do alcance da limpeza diária, permitindo que camadas perigosas de poeira se acumulassem sem serem notadas.

Como aconteceu o acidente

No dia 29 de janeiro de 2003, pouco depois do almoço, a rotina parecia normal na planta. Por volta das 13h28, uma explosão violenta sacudiu a fábrica. Testemunhas relataram um som semelhante a um trovão, seguido pelo desabamento de paredes e pela projeção de destroços. Logo em seguida, um incêndio de grandes proporções tomou conta da instalação. As chamas rapidamente saíram de controle e foram tão intensas e difíceis de conter que, apesar da ação imediata do Corpo de Bombeiros local com apoio da Guarda Nacional e de equipes de cidades vizinhas, o fogo continuou a arder por dois dias inteiros, destruindo praticamente toda a unidade.

As consequências do desastre

Seis pessoas perderam a vida e outras 38 ficaram feridas, entre elas dois bombeiros. A força da explosão foi tão intensa que provocou danos severos a toda a estrutura da fábrica, destruiu paredes, causou o colapso de galpões e deixou o prédio inutilizável. Empresas vizinhas também foram atingidas, vidros foram estilhaçados em uma escola a mais de um quilômetro de distância e famílias que moravam próximas precisaram ser evacuadas por precaução. Incêndios se espalharam por até três quilômetros no parque industrial devido a destroços em chamas levados pelo vento. Quatorze meses após o acidente, a produção foi transferida para outra instalação e a área onde ocorreu a tragédia nunca mais foi reativada.

Investigação e causas do desastre

As conclusões da investigação do CSB (Chemical Safety and Hazard Investigation Board) apontaram que a tragédia ocorreu devido a uma série de falhas sistêmicas. Não houve uma avaliação técnica adequada para o uso de polietileno e estearato de zinco como agentes antiaderentes, e os controles de engenharia não asseguraram a aplicação das normas técnicas relacionadas ao risco de poeira combustível. Também foram encontradas falhas na revisão das fichas de segurança dos materiais, que não identificaram os riscos do pó combustível, além de lacunas graves no programa de comunicação de riscos, deixando os trabalhadores sem qualquer alerta para esse perigo específico.

A investigação revelou que a explosão teve início quando pó de polietileno altamente combustível, acumulado acima do forro suspenso, foi dispersado e incendiado por uma fonte de ignição não determinada, possivelmente uma faísca ou superaquecimento de equipamento. A explosão inicial rompeu as tubulações do sistema de sprinklers, impedindo a contenção do incêndio.

Quando a aparência engana

O desastre da West Pharmaceutical é a prova de que, em um ambiente industrial, aquilo que parece inofensivo pode se transformar em tragédia em questão de segundos. Poeira fina, quase invisível, acumulada ao longo dos anos, ganhou comportamento de pólvora quando encontrou uma fonte de ignição. Mesmo com equipes de limpeza trabalhando 24 horas por dia para manter tudo impecável, o perigo estava escondido nos espaços que ninguém via. O que começou como um resíduo imperceptível terminou em explosão, fogo e vidas perdidas. A lição é clara: ignorar a poeira é brincar com um inimigo silencioso e imprevisível. Fica o alerta: Até onde você confia naquilo que não vê?

A série Lições Explosivas investiga tragédias industriais envolvendo poeiras combustíveis e condições negligentes de segurança. A cada episódio, um caso real é revisitado em detalhes para revelar as falhas humanas, institucionais e tecnológicas que o provocaram. Mais do que relatar acidentes, esta série busca extrair lições para que outras vidas não se percam da mesma forma.

Lições Explosivas

Leia todos os artigos da série

Acessar Lições Explosivas
Compartilhe